A Estátua e a Rosa

Pelo soco de pedra, ao sol da manhã branda,
vê a estátua enroscar-se uma rama espinhosa.
Qual se a vida animasse a votiva guirlanda,
entre as flores de bronze expande-se uma rosa.
Milagre natural, mimo da primavera,
entre as formas e a cor a atenção lhe reparte.
E' o trevoso mistério onde à vida se gera,
a florir no esplendor de um leve sonho de arte!
Mas a rosa, soerguendo a corola orvalhada,
Soluça a mágoa atroz que a alma de flor lhe corta:
- "Tu, por homem mortal concebida e talhada,
tu não morres, estátua! Eu amanhã sou morta.
O meu viço é agonia. Um fado bem diverso
te assegura uma vida esplêndida e tranquila.
O sol, meu pai e algoz, juntou meigo e perverso,
ao vigor que me exalta o mal que me aniquila..."
E a estátua respondeu:
- "Rosa, invejo-te a sorte.
A glória de durar é uma longa miséria.
Que ironia, viver, engolfada na morte,
a vida vã da forma e o sono da matéria!
Eu provenho de um sonho e essa flor de poesia
só dentro da alma brota e fenece onde medra.
Em nascendo, tornei-me a carcaça vazia.
da ilusão que tentou eternizá-lo em pedra.
O sonho é um torvelim sem medida e sem norma;
é um latejar de vida, onde fervente e amarga.
A obra de arte, ao sair da mão que lhe dá forma,
é a vasa densa e vil que a onda, refluindo, larga...
O sonho de beleza, esse estado de graça,
não se fixa jamais, move-se como a vida.
A obra surge e resplende. Ele prossegue e passa.
E a obra viva e perfeita é a que não foi concluída...
Um dia serei pó. Tu viverás, rubente,
enquanto o mundo rola ao sol de ouro que te ama.
Tu sim, reflorirás indefinidamente,
com essa forma, essa cor, asse orvalho, essa flama.
Tu sim, és imortal nessa fragilidade.
Tu sim, ostentarás, pelos tempos em fora,
a perpétua frescura, a eterna mocidade,
à luz de cada aurora!"

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